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Seminário de Algodão Orgânico em Paulistana (PI) reforça importância da certificação participativa e busca fomento de políticas públicas locais e novas parcerias


Com histórico de alta produtividade, são esperadas 10 toneladas de pluma de algodão com certificação orgânica participativa de Paulistana (PI) por 66 famílias agricultoras, um aumento de quase 20% em relação ao ano anterior. Por outro lado, busca-se apoio para avanço da cadeia produtiva no processamento dos alimentos dos consórcios.

Campo consorciado de algodão com certificação orgânica participativa em Paulistana (PI), Comunidade de Abelha Branca, Unidade de Aprendizagem e Pesquisa Participativa (UAP)

A temida praga do bicudo do algodoeiro, que castigou drasticamente a cultura do algodão no Piauí e em outros estados do Nordeste na década de 1980, não impossibilita mais o exponente avanço da produção das famílias agricultoras da zona rural do município de Paulistana (PI). Isso porque há quatro anos, mais de 117 famílias, distribuídas em 6 núcleos de produção, são apoiadas pelo Projeto Algodão em Consórcios Agroecológicos/Diaconia, em parceria com a Cáritas Diocesana de São Raimundo Nonato/PI, visando apoiar a Associação dos/das Produtores/as Agroecológicos do Semiárido Piauiense (APASPI) – Organismo Participativo de Avaliação da Conformidade Orgânica (OPAC) que controla a conformidade orgânica em unidades familiares produtivas por meio do Sistema Participativo de Garantia (SPG).  

Da totalidade, 66 famílias agricultoras fazem parte do núcleo de Paulistana (PI), responsável por cerca de 77% da produção total de pluma de algodão com certificação e transição orgânica participativa do território. O objetivo do projeto é desenvolver um modelo de cultivo sustentável que é capaz de auxiliar no controle de pragas sem ser necessário o uso de pesticidas e fogo, isso através do conjunto de regras e boas práticas que visa estruturar cadeias produtivas além do algodão, de modo a aproximar a agricultura familiar ao comércio justo, proporcionar segurança alimentar e apoiar aproximação dos produtos agrícolas na geração do selo brasileiro orgânico.

Nesse sentido, o cultivo do algodão aliado com diferentes plantas é um dos principais ganhos percebidos por agricultores e agricultoras que seguem corretamente o protocolo de cultivo. Para Francisca Maria, agricultora ligada à APASPI e à Associação dos Produtores Rurais do Piauí Agroecológico (APROPRIA), não faltam motivos para incentivar a comunidade a também participar do projeto.

“Sempre fui agricultora, mas nunca tive a cultura de plantar o algodão em consórcios com as demais lavouras que eu já cultivava. Esse Projeto Algodão foi um grande incentivo porque além das outras plantas, hoje cultivo o algodão na mesma área, o que traz uma renda a mais para a minha família. Eu incentivo nossa comunidade para que se desenvolvam juntamente conosco no município porque só quem tem a ganhar são as famílias agricultoras”, afirma.

Tal colocação também é observada por Jonilson Sousa, presidente da APASPI, que é o OPAC com credenciamento no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) para comercialização das produções agrícolas com o selo brasileiro orgânico. “Agora as famílias têm uma renda muito boa que é o algodão. Antes havia uma cultura de plantar uma coisa só, mas agora temos várias plantas como o milho, sorgo, feijão de porco, feijão e outros, que trazem melhoria para a qualidade de vida das famílias agricultoras”, diz.

Agricultor multiplicador Almiro Costa em campo consorciado de algodão com certificação orgânica participativa em Paulistana (PI), comunidade de Abelha Branca, UAP

Para Sebastião Lopes, presidente da APROPRIA que também é ligado à APASPI, é necessário ir além da comercialização do algodão. “Um dos desafios que precisamos vencer é a comercialização para os outros produtos como milho, feijão, gergelim porque já temos a venda garantida do algodão, mas dos outros produtos ainda não temos”, explica.

Há quatro anos, a pluma do algodão com certificação e transição orgânica participativa é destinada ao comércio justo, especificamente, para a marca de calçados franco-brasileira Veja/Vert. Para Valdenira Rodrigues, engenheira agrônoma da Veja/Vert, responsável pelo processo de recebimento do algodão nas comunidades apoiadas pelo Projeto, o potencial do grupo de Paulistana-PI é perceptível e por isso, requer maiores investimentos.  

“Esse grupo é excelente em vários aspectos: tem alta produtividade, média alta de área plantada, caderno de campo excelente, super organizado e tem várias lideranças. É um grupo que acredito que chegará muito fácil em 150 famílias, só precisa de ter mais apoio tecnológico e de assessoria técnica”, diz. Tal observação também é reforçada pelo presidente da APROPRIA ligado à APASPI Sebastião Lopes: “Para avançarmos mais, precisamos de incrementar a assistência técnica e visitas às novas famílias através de projetos e parcerias que possam nos financiar para alcançarmos mais grupos e aumentar a produtividade”, afirma.

Valdenira Rodrigues, engenheira agrônoma da Veja/Vert no Seminário do Algodão Orgânico – Paulistana/PI.
Presidente da APROPRIA ligado à APASPI, agricultor Sebastião Lopes, unidade de descaroçamento e rastreabilidade de algodão com certificação e transição orgânica participativa.

1º Seminário de Algodão Orgânico em Paulistana/PI – Desde 2018, o sertão do Piauí tem sido referência na produção da pluma do algodão com certificação e transição orgânica participativa em consórcios com outras culturas alimentares. Em 2021, das oito toneladas de pluma produzidas pelas famílias agricultoras ligadas à APASPI, mais de 6 foram da região de Paulistana (PI). Neste ano, são previstas cerca de 13 toneladas pela APASPI, sendo esperadas 10 t de Paulistana (PI).

Diante da relevância dessa região no cultivo do algodão, a APROPRIA em conjunto com a APASPI realizou pela primeira vez um seminário voltado à discussão do algodão orgânico em Paulistana/PI, evento que aconteceu no dia 01 de setembro na Câmara Municipal de Vereadores. Mais do que isso, ficou clara a necessidade de investimentos para o processamento dos demais alimentos que são produzidos em consórcios com o algodão.

Segundo o presidente da câmara de vereadores de Paulistana, Osvaldo Mamedio, que também é agricultor na comunidade de Abelha Branca, o evento serviu para difundir as práticas, assim como mostrar o impacto do projeto no fomento da renda e no desenvolvimento sustentável do município.

“Além das práticas para o controle de pragas, o projeto é também uma forma de dar garantia de renda financeira a essas famílias com a comercialização da pluma, mas também de garantir a segurança alimentar com os produtos das mesmas áreas. Assim como fazemos com o algodão, a nossa perspectiva é conseguir estrutura para extrair o óleo da semente do algodão e outros. Para início, temos uma associação em Abelha Branca – PI, uma casa de mel toda padronizada que não poderá ser usada para apicultura devido ter sido construída no centro do povoado. Então a nossa intenção é transformar aquela casa em uma unidade de processamento de alimentos das famílias agricultoras, enquanto futuramente conseguiremos recursos de projetos para uma estrutura maior”.

Presidente da câmara de vereadores de Paulistana/PI, Osvaldo Mamedio, em apresentação no 1º Seminário de Produção do Algodão Orgânico

Já de acordo com Gean Bastos, assessor técnico da Cáritas Diocesana de São Raimundo Nonato – PI, as discussões no seminário foram positivas para visibilidade da atividade no território e mapeamento da expansão de possíveis parcerias. “O seminário veio fortalecer o movimento de uma região que tem na sua bandeira uma história muito forte com o algodão. Foi um momento ímpar de possibilitar o conhecimento a novos/as agricultores/as e autoridades do município sobre a questão da certificação orgânica e da produção do algodão em consórcios agroecológicos”, afirma.

Gean Bastos em apresentação na Câmara de Vereadores de Paulistana (PI)

De acordo com Fábio Santiago, coordenador do Projeto Algodão/Diaconia, o seminário representou um colegiado de atores sociais onde foi possível apresentar as regras e boas práticas do algodão em consórcios a partir do protocolo, a segurança alimentar, a baixa pegada de carbono do algodão consorciado em relação ao algodão orgânico adensando australiano, entre outros.

“É fundamental a continuidade de seminário anual, de modo a criar espaços permanentes de diálogo, controle social e mobilização social para envolvimento de novas famílias agricultoras ao Projeto. Os agricultores e agricultoras presentes no seminário observaram que é possível a retomada do algodão e avanço de outras cadeias dos consórcios (milho, feijão, amendoim, girassol, gergelim, feijão de porco, feijão guandu, entre outras) como geradoras de renda, num modelo de venda direta para as prateleiras da sociedade, agregando valor com o selo brasileiro orgânico e contribuindo para uma experiência de referência para promoção de políticas públicas para a região Nordeste do Brasil”, explica Santiago.

Fábio Santiago em apresentação na Câmara de Vereadores de Paulistana (PI)

Para Juvaldi Luz, técnico da Extensão Rural e Pesquisa Agropecuária (EMATER), o impacto do modelo de cultivo do algodão em consórcios agroecológicos marca uma significativa mudança para o desenvolvimento do município, principalmente diante do futuro avanço da produção de alimentos pela agricultura familiar na localidade. “Não tem nem como se medir a importância de processar esses alimentos. Além da questão ambiental, da emissão de baixo carbono, ainda tem a agregação de valor e geração de renda junto ao algodão através do gergelim, amendoim, sorgo, feijão de porco, feijão guandu, palma e outros”, afirma.

Ainda segundo o técnico da Emater, após a realização do seminário, ficou acordado com a coordenação regional da instituição o envio de seis técnicos para acompanhar agricultores e agricultoras que cultivam o algodão consorciado no município, assim como auxiliar na capacitação de novas famílias agricultoras.   

Juvaldi Luz, técnico da Extensão Rural e Pesquisa Agropecuária (EMATER)

Estiveram presentes no seminário representantes de associações, sindicatos da região, Veja/Vert, legislativo municipal, gerente geral do Banco do Nordeste em Paulistana Lázaro Lima, gerente de Desenvolvimento do Banco do Nordeste Michel Moreira. Também foi realizada uma visita na usina de descaroçamento da APROPRIA para demonstrar o processo de descaroçamento e prensa da pluma do algodão que é encaminhada para cadeia de produção dos tênis da Veja/Vert.

Visita à usina de descaroçamento da APROPRIA – Paulistana (PI)

Projeto Algodão em Consórcios Agroecológicos – É uma iniciativa coordenada por Diaconia, em parceria estratégica com a Universidade Federal de Sergipe (UFS, Campus Sertão – Nossa Senhora da Glória/SE). O Projeto conta com o apoio financeiro da Laudes Foundation, da Inter-American Foundation (IAF) e do FIDA/AKSAAM/UFV/IPPDS/FUNARBE. O Projeto ainda é parceiro do SENAI Têxtil e Confecção da Paraíba, e com o Projeto + Algodão – FAO/MRE-ABC/Governo do Paraguai/IBA. Para a execução do Projeto nos territórios, a Diaconia estabeleceu parcerias com ONGs locais com experiência em Agroecologia que são responsáveis pelo assessoramento técnico para fortalecer os Organismos Participativos de Avaliação da Conformidade Orgânico (OPACs) e a produção agroecológica. No Sertão do Piauí, a Cáritas Diocesana de São Raimundo Nonato desenvolve as atividades na Serra da Capivara. No Sertão do Cariri, na Paraíba, o trabalho está sendo realizado pela Arribaçã, tendo ainda a parceria com o CEOP – Território do Curimataú/Seridó da Paraíba. No Sertão do Araripe, em Pernambuco, as ONGS CAATINGA e CHAPADA assumiram conjuntamente as ações do Projeto. As atividades no Alto Sertão de Alagoas e no Alto Sertão de Sergipe estão a cargo do Instituto Palmas e do Centro Dom José Brandão de Castro (CDJBC), respectivamente. No Sertão do Pajeú (PE) e no Oeste Potiguar (RN), territórios onde a Diaconia já mantém escritórios e atividades, ela mesma se encarrega da implementação das ações locais do Projeto e parceria com CPT – RN.